Regressão dos 4 meses!

Como consultora de sono, ouço o termo "regressão" utilizado em relação a quase todas as circunstâncias imagináveis. Essencialmente, se o bebé não dormir bem durante algumas noites, os pais começam a falar na palavra "R". Algumas pessoas subscrevem a ideia de que há uma regressão de 8 meses, uma regressão de 9 meses, uma regressão de 1 ano, bem como regressões de dentição, regressões de crescimento e assim por diante. Outros, vêem-nas como simples percalços causados por circunstâncias atenuantes. Mas relativamente à regressão dos quatro meses, todos concordam, e por uma boa razão. É real e permanente!

Para compreender o que está a acontecer ao seu bebé durante esta fase, primeiro precisa de saber algumas coisas sobre o sono em geral. Por isso, aqui está a razão científica, contada em linguagem corrente.

Muitos de nós apenas pensamos no sono como uma situação de "ligado” ou “desligado". Ou se dorme ou não se dorme. Mas o sono tem de facto várias fases diferentes, e estas compõem o "ciclo do sono", pelo qual passamos várias vezes por noite. 

A fase 1 (Sonolência) é aquela etapa inicial que todos nós conhecemos, em que nos sentimos à deriva, mas não nos sentimos realmente como se estivéssemos a dormir. Dura cerca de 5 minutos, os olhos movem-se lentamente, a respiração torna-se mais lenta e atividade muscular abranda. É uma fase em que acordamos facilmente. 

A fase 2 (Sono leve) é considerada a primeira fase do "verdadeiro sono". Esta é a fase em os movimentos dos olhos param, o batimento cardíaco abranda e a temperatura do corpo diminui. É uma fase na qual o corpo já se encontra relaxado, mas a mente ainda está atenta e, por isso, é fácil acordarmos com algum ruído ou movimento de outras pessoas. 

A fase 3 é profunda e regenerativa (Sono profundo). Esta é a fase na qual os músculos relaxam completamente e o corpo fica menos sensível a estímulos externos, como movimentos e ruídos, sendo difícil acordarmos. Nesta fase a mente está desligada e, por isso, também não existem sonhos. Esta fase é extremamente importante para a reparação do sistema imunitário, dos tecidos musculares, das reservas de energia e, no caso das crianças, para as etapas de crescimento e desenvolvimento.

A fase 4 é o sono REM (Movimento Rápido dos Olhos). Esta é a última fase do ciclo de sono e dura cerca de 10 minutos. Normalmente, começa 90 minutos depois de adormecermos. Nesta fase, os olhos movimentam-se muito rapidamente, o batimento cardíaco aumenta e os sonhos aparecem. É aqui que o cérebro começa a consolidar a informação e as memórias do dia anterior. É também nesta fase que pode surgir o sonambulismo, no qual a pessoa pode levantar-se e andar pela casa, sem chegar a acordar. A fase REM vai sendo mais demorada a cada ciclo de sono, podendo chegar até 20 a 30 minutos de duração.

Depois de termos passado por todas as fases, ou acordamos ou estamos quase a acordar, e depois recomeçamos até que o despertador dispare.

Então, o que tem isto a ver com a temida regressão de que falávamos originalmente?

Bem, os recém-nascidos têm apenas 2 fases de sono: fase 3 e REM, e passam cerca de metade do seu sono em cada fase. Mas por volta do terceiro ou quarto mês, há uma reorganização do sono, à medida que evoluem para um ciclo de sono de 4 fases, no qual permanecerão até ao final das suas vidas. 

Quando esta mudança ocorre, o bebé passa de 50% para 25% de sono REM, de modo a criar espaço para as duas primeiras fases. Assim sendo, embora o sono REM seja leve, não é tão leve como estas 2 novas fases a que se está a habituar. Passando mais tempo em sono mais leve, aumentam, naturalmente, as hipóteses de o bebé acordar. Isto não quer dizer que queremos impedir ou evitar que o bebé acorde. Acordar é absolutamente natural, e, mesmo em adultos, continuamos a acordar três, quatro, cinco vezes por noite. 

Como adultos, porém, quando acordamos durante a noite, somos capazes de reconhecer que ainda é de noite que “não há monstros na nossa cama” e por isso voltamos a adormecer.

"Normalmente fazêmo-lo tão rapidamente que, na manhã seguinte, nem sequer nos lembramos de ter acordado. A um bebé de quatro meses, claro, faltam estas competências de pensamento crítico. Para um bebé desta idade que adormeceu ao colo da mãe, o raciocínio seria muito mais: "OK, a última coisa que me lembro é que havia um rosto familiar, eu estava a mamar, e alguém estava a cantar-me uma canção calmante. Agora estou sozinho nesta sala escura, não há comida, e provavelmente há pelo menos três, possivelmente quatro, monstros assustadores por perto".

Isto é provavelmente um exagero, mas quem sabe o que se passa na mente de um bebé de quatro meses de idade?De qualquer modo, agora que o bebé se apercebeu subitamente que a mãe não está por perto, e não tem a certeza absoluta onde está, a reação mais natural é assustar-se.

Tal como um adulto, quando o bebé se assusta, instintivamente entra numa espécie de estado “lutar ou fugir” e não vai voltar a adormecer sem uma garantia significativa de que tudo está bem.

O outro grande causador desta regressão é que até este ponto, os pais conseguiam adormecer o seu bebé com uma chucha, embalando-o, amamentando-o ou alguma outra técnica semelhante em que o bebé era ajudado a adormecer. 

Agora que o bebé está a passar mais tempo em sono leve, e por isso tem uma maior probabilidade de acordar, isto torna-se subitamente um problema muito maior. Estas “muletas” ou associações de sono podem tornar-se verdadeiras armadilhas, porque embora possam ser úteis para ajudar o seu pequeno nessa fase inicial para adormecer, a falta delas quando acorda, apenas fará com que não seja capaz de voltar a adormecer sem alguma ajuda externa. Começam então as lutas de sono, o choro, o aumento da adrenalina… Quando esta situação começa a acontecer de meia em meia hora, torna-se um verdadeiro pesadelo para os pais.

A boa notícia para qualquer pessoa que passe pela temida Regressão do Sono de Quatro Meses é que esta não é, de facto, uma regressão. Uma regressão é definida como uma "reversão a um nível mental ou comportamental anterior", e isso é na verdade o oposto do que o seu bebé está a viver. Seria bastante mais apropriado designá-la por "Progressão de Sono dos Quatro Meses".

Portanto, debrucemo-nos sobre a grande questão. O que pode fazer para ajudar o seu bebé a adaptar-se?

Em primeiro lugar, assegure-se que o quarto está completamente escuro. Poderá, eventualmente, pensar que o quarto do bebé já está suficientemente escuro, ou que ele  pode não gostar do escuro, e que é reconfortante ter um pouco de luz a entrar pelas janelas ou a infiltrar-se pelo corredor. Definitivamente, não! O quarto do bebé deve ser mesmo escuro. Refiro-me a uma mina de carvão numa noite sem lua! Se necessário, coloque toalhas ou lençóis nas janelas de forma a tapar o menor raio de luz ou claridade. Os recém-nascidos e os bebés não têm medo do escuro. São, no entanto, sensíveis à luz. Esta dá indicação aos seus cérebros de que é tempo de atividade e de estar em estado de alerta, e o cérebro segrega a hormona do stress (cortisol), pelo que queremos manter o quarto de dormir absolutamente escuro durante a noite e nas sestas. 

A outra Némesis do sono diurno (e da noite, embora não tão frequentemente) é o ruído, quer seja a campainha da porta, o cão a ladrar, ou algo a cair no chão no quarto ao lado. Com o bebé a passar mais tempo num sono mais leve, os ruídos assustam-no facilmente e acordam-no, pelo que uma máquina de “White noises” poderá ser uma boa opção para “abafar” todos esses ruídos.

“Mas isso não é uma ”muleta" para adormecer?", perguntam vocês. Bem, de certa forma, é, mas não requer qualquer reinicialização, reinserção, ou presença parental. Está simplesmente lá e pode estar ligado enquanto o bebé estiver a dormir, por isso não é uma “muleta” que precisemos de evitar.

Outro componente essencial para que o seu bebé durma bem é a implementação de rotinas que sejam totalmente previsíveis, relativamente curtas (não mais que 4 ou 5 passos) e se possível inalteradas. Este passo confere segurança ao bebé e acaba por funcionar como um “gatilho”, como se estivesse a enviar um sinal ao bebé que chegou a hora de ir dormir. O último passo da rotina nunca deve ser a refeição (leite materno ou fórmula infantil). Caso contrário, arrisca-se a que o bebé adormeça ao peito ou ao biberão, e isso irá criar uma nova “muleta” - a associação da alimentação com o sono! 

Por outro lado, estas rotinas só funcionarão se o bebé não adormecer no decorrer das mesmas. Lembre-se que o objectivo da rotina não é adormecer o bebé, mas sim, dar-lhe sinais que a hora de ir dormir está próxima.

Por fim, mas não menos importante, não espere que o seu bebé atinja o pico de cansaço para o deitar. Este é um erro muito comum! Quando o bebé está bem disposto, os pais tendem a aguardar para que comece a dar alguns sinais de cansaço e só então, começam a pensar em deitá-lo. O problema é que, frequentemente, o bebé já vai extremamente cansado para a cama. Quando os bebés ultrapassam a sua “janela de oportunidade”, entram em cansaço extremo, o que aumenta o nível de stress e a produção de cortisol, dificultando todo o processo de adormecer. Quantos pais já se questionaram porque é que o seu filho não adormece, se está claramente cheio de sono? Esta é a razão: quando o bebé já está em privação de sono, tem muito maior dificuldade em adormecer. 

Então, como sair deste ciclo vicioso? Estabeleça um horário diurno e noturno que funcione para o seu filho (variável consoante a idade). Mesmo que ele não demonstre sinais de cansaço, é importante que mantenha o horário, de modo a não ultrapassar a sua janela de tempo acordado.

Em suma, a melhor forma de ultrapassar esta ou outra regressão de sono será manter-se consistente no desenvolvimento de estratégias de sono independente!



Relacionados